Sônia Pillon é jornalista e escritora, formada em Jornalismo pela PUC-RS e pós-graduada em Produção de Texto e Gramática pela Univille. Integra a AJEB Santa Catarina. Fundadora da ALBSC Jaraguá do Sul.
Coluna: Fragmentos do passado
Nos últimos tempos, ultrapassando a casa dos 90 anos, Iolanda admirava a natureza, se aquecia com os raios do sol sentada junto à janela, admirava a dança das borboletas no jardim e ficava atenta ao canto dos pássaros.
25/07/2021
Por Sônia Pillon
Se você me perguntar, confesso que não saberia precisar o ano. Podemos dizer que essa história começou entre as décadas de 1920 e 1930, em uma comunidade rural de descendentes de italianos no Sul do Brasil. Não difere de tantas outras, em circunstâncias semelhantes. Mudam os sobrenomes, mas as vivências são praticamente as mesmas.
Iolanda desde pequena ouvia os relatos do nono Luigi e ficava imaginando o quanto de coragem foi necessária para entrar num navio a vapor e cruzar os mares até chegar ao Brasil. Sabia que trouxeram esperança na bagagem, fugindo da guerra e da fome. Que sonhavam em ter a própria terra e progredir. E foi nessa atmosfera de muito trabalho que ela nasceu, filha de Angelina e João, um dos filhos do nono, nascido brasileiro.
A família era numerosa, como já não se encontra hoje em dia. Tinha mais quatro irmãs e cinco irmãos. Cada um fazia a parte que cabia na colônia. As meninas ajudavam a mãe nos serviços da casa e os meninos iam para a lavoura acompanhar o pai.
Mamma Angelina estava de pé antes mesmo do sol raiar, a primeira a levantar e a última a descansar. Ia ordenhar as vacas e depois preparava o café para a numerosa família. Afinal, tinha 10 filhos! Fazia uma polenta como ninguém. Levava uma vida de sacrifícios, com poucos confortos, dedicada ao trabalho e às obrigações familiares. Discreta, se mostrava sempre pronta para servir. De poucas palavras, também não era pródiga em sorrisos. Essa era a rotina de Angelina, e Iolanda seguiu os passos da mãe.
Naquela época, “divisão de tarefas domésticas” e “igualdade de direitos entre homens e mulheres” eram condições totalmente desconhecidas, beiravam ao absurdo, especialmente no meio rural. Admiráveis mulheres de fibra, incansáveis, líderes em seus núcleos, ainda que com limitado espaço social.
E assim, nesse universo, cresceu Iolanda, voltada às tarefas do lar e à simplicidade da vida do campo. Moça ela casou, foi mãe e avó. E assim, décadas foram passando.
Nos últimos tempos, ultrapassando a casa dos 90 anos, Iolanda admirava a natureza e se aquecia com os raios do sol sentada junto à janela. Sorria ao ver a dança das borboletas nas flores do jardim e ficava atenta à sonoridade relaxante do canto dos pássaros. O ritmo se tornou cada vez mais lento para ela.
Essa semana, Iolanda partiu. Deixou um rastro de melancolia. Agora, sobraram apenas dois dos dez filhos da mamma Angelina, que com certeza a recebeu de braços abertos. Vá em paz, Iolanda!
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