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Coluna: A luz voltou!

Faltou luz no apartamento! Não pense no sentido metafórico, dos que buscam a iluminação interior… Não, não! Estou falando no sentido prático, mesmo, do corte da energia elétrica, poucos dias após a mudança (exaustiva!) de residência, e no meio da manhã. Justamente agora, quando me preparava para fritar batatas no…

20/08/2023

Faltou luz no apartamento! Não pense no sentido metafórico, dos que buscam a iluminação interior… Não, não! Estou falando no sentido prático, mesmo, do corte da energia elétrica, poucos dias após a mudança (exaustiva!) de residência, e no meio da manhã. Justamente agora, quando me preparava para fritar batatas no air fryer? Que transtorno!

A primeira coisa que fiz foi me dirigir ao corredor do prédio e acionar a lâmpada, que acendeu normalmente. Como assim?! Fui conferir e vi que o cabo de energia tinha sido cortado. Sim, o morador anterior deixou de pagar a conta, e a Celesc tem “até 24 horas para efetuar a religação”. Ok!

O dia foi correndo e a esperança de que tudo ficasse resolvido até o final da tarde não se confirmou. A bateria do celular já estava acabando e a saída foi pegar um banquinho e carregar no corredor do prédio. Pense no constrangimento! A cada chegada de moradores, precisava resumir o ocorrido com um sorriso amarelo… Carreguei o celular até conseguir o mínimo para avisar sobre a situação, e depois desliguei. Vai saber que horas do dia seguinte o técnico da operadora de energia elétrica daria as caras? Felizmente uma “boa alma” se prontificou e levou os perecíveis da geladeira até o desfecho dessa história.

Então, ao entrar de novo no apartamento, peguei o castiçal com vela pela metade, mais uma vela sem uso, e completei buscando a vela à pilha do oratório budista. Na sequência, coloquei as velas na mesa da cozinha enquanto preparava o lanche da noite, resignada. Sem assistir noticiários, nem ter a opção de conferir as novidades da Netflix e dos Youtubers, o que fazer?!

Percebi que a sombra da vela de cera projetava e ampliava um objeto decorativo na parede, de um egípcio segurando oferendas em ambas as mãos. E o mais surpreendente é que essa imagem estava em frente a uma pintura produzida a partir de uma foto minha, em que estou lendo um livro. A cena formada pela sombra foi tão inusitada que liguei novamente o celular para registrar, assim como as velas sobre a mesa.

Fiquei imaginando o quanto essas cenas eram corriqueiras e poderiam passar despercebidas no tempo em que as opções para iluminar os ambientes se restringiam a velas e lamparinas de querosene. Confesso que ri com essa perspectiva. Me senti uma dama machadiana do século 19, com seus longos vestidos, leque, chapéu e lencinhos de cambraia (ou seda…).

Resolvi entrar nessa vibe e pensei: “O que uma mulher daquela época, que gosta de ler, faria no meu lugar?”. Decidi resgatar o livro “Carta ao Pai”, de Franz Kafka, e seguir com a leitura, interrompida diversas vezes por a considerar angustiante. Sem TV, nem mídias sociais, era o momento propício para acabar com a procrastinação.

Confesso que ler à luz de velas exige um esforço bem maior, mas segui lendo e me emocionando com os trechos em que o autor exibia seus sentimentos mais profundos, de mágoa e baixa autoestima, provocados pela rigidez do pai. Fui lendo, lendo, até a vela reserva apagar e me obrigar a ir dormir.

Na manhã seguinte, precisamente às 7h28, a luz voltou! Ufa! Que alívio!

Existem períodos da vida em que a realidade está tão presente no nosso dia a dia, nos mantendo permanentemente com os pés no chão, que é como se estivéssemos presos com chumbo ao solo, não é mesmo?

Fazendo um retrospecto das últimas 24 horas, e sob a perspectiva da “imersão” aos hábitos e costumes de um tempo distante, a experiência até que teve seu lado positivo.

Identificar novas possibilidades em momentos inesperados (como um corte de luz), pode transformar a indignação inicial em algo produtivo. Ou lúdico, como olhar mais atentamente para o céu e perceber, de forma mais nítida e prazerosa, o brilho das estrelas…

Por

Sônia Pillon é jornalista e escritora, formada em Jornalismo pela PUC-RS e pós-graduada em Produção de Texto e Gramática pela Univille. Integra a AJEB Santa Catarina. Fundadora da ALBSC Jaraguá do Sul.

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