CONTO
Por Sônia Pillon
Era final de tarde no distrito de Águas Límpidas, naquele longínquo outono de 1957. Sentada na cadeira de rodas de frente para a Estrada Geral, minha tia avó Juliete observava a fascinante manifestação da natureza, com suas cores e aromas peculiares. A matriarca, que se mantinha na varanda, buscava alegrar o coração admirando as árvores e as flores do jardim que ela mesmo havia plantado e que, por muitos anos, só recebia os cuidados dela. Adorava sentir o cheiro da terra. Foram décadas de zelo e amor pelas plantas. Harmoniosamente, os cinamomos, palmeiras e os chorões dividiam o espaço com a grama verdinha e os canteiros floridos, que abrigavam roseiras, margaridas, crisântemos, copos-de-leite, hortênsias, aves-do-paraíso, lírios-da-paz, begônias…
Abraçadas aos cinamomos, as orquídeas “Olho-de-boneca” e “Laelia purpurata” sempre chamavam a atenção de quem passava pela rua. Muitos faziam questão de descer dos carros para conferir de perto. Queriam comprar flores e mudas, mas ela nunca aceitou. A fama do “jardim da dona Juliete” se espalhou pela cidade e chamou a atenção do jornal local, tornando o lugar um ponto turístico obrigatório para os visitantes.
Ela costumava não somente regar, podar e retirar as ervas daninhas, mas também às vezes se via falando e confidenciando com elas, como se fossem amigas. Especialmente nos momentos de angústia e dor, era no jardim que buscava refúgio e reencontrava a paz. Da terra tirava a força para seguir em frente.
Mas foi naquele melancólico fim de tarde, com o sol prestes a se despedir, que a veterana tia avó se ateve na ventania, mas dessa vez de uma forma diferente. Acompanhou a intensidade dos ventos pelo treme-treme das palmeiras. Os caules das palmeiras envergavam de um lado e de outro, em uma espécie de dança frenética. Dava para ouvir os ventos uivando, sacudindo e arremessando as folhas.
Ao ver o chão coberto pelas folhas secas, pensou nos ciclos da vida. Disse que o tempo de cada um é incerto. Foi então que ela desabafou comigo, com tristeza no olhar.
– Quantas vezes foquei no futuro sem prestar a atenção no momento presente? Quantas vezes remoí mágoas do passado que me impediram de aproveitar e valorizar as oportunidades que a vida me oferecia? Foram tantas as vezes em que deixei a insegurança e o orgulho falarem mais alto… Cada dia vivido foi um dia a menos na jornada…
Por fim, me disse palavras que me marcaram para sempre. – Nunca se deve esquecer de viver o hoje, porque o tempo não para e não volta, como essa folha caída que um dia foi verde”.
Tudo isso minha tia avó me disse naquele dia, olhando no fundo dos meus olhos. Foi a maior lição que ela deixou para mim.
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